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até que esgotem
(...) Voltou a si e ao momento. Naquele dia vira-a mais bonita. Ela era toda bonita. De que cor eram os seus olhos, perguntavam-lhe em casa.
A mãe, admirada, perguntava-lhe:
Então, rapaz, nunca lhe viste os olhos?
Ele, a modos que zangado, respondia-lhe com alguma perturbação: Que importa os olhos, se gosto dela?
João Cabrita, Amor e Mar... Em Armação de Pêra,
parte da Antologia de Contos do Algarve (Arandis Editora, 2020)
É no teu olhar tão puro
Que vou lendo o meu futuro,
Pois o passado esqueci;
E fico recompensado
Da perda desse passado
Quando estou ao pé de ti.
António Aleixo
Por esta altura do ano passado, questionei quando iria a Academia Sueca sacudir o pó que a cobre e ousar a atribuição do Nobel da Literatura a um autor fora do circuito ortodoxo dos livros. Devo ter sido ouvido: este ano, o galardoado é Bob Dylan. Eu teria preferido Tom Waits ou Leonard Cohen, pois a obra de Dylan não me inspira a mesma reacção emocional, mas reconheço o seu papel e aceito a escolha sem problemas.
"When an old man dies, a library burns to the ground". Não conheço muitas pessoas que tenham feito tanto por merecer esta expressão como Umberto Eco.
Neste mundo, ninguém pensa em nada. Todos se ocupam dos seus negócios, da sua fortuna, dos seus prazeres, da sua vida, enfim, ou de pequenas futilidades divertidas como o teatro, a pintura, a música ou a política, a mais vasta das bagatelas, ou de assuntos industriais. Mas quem é que pensa?
(Guy de Maupassant, "O Homem De Marte")
Como gosto de exercitar uma pitada ocasional de pedantismo intelectual, aqui vão as minhas previsões para o Nobel da Literatura de 2015:
1) muitíssimo provavelmente nunca o li;
2) muito provavelmente nem sequer sabia da sua existência;
3) provavelmente nunca mais escreverá uma obra que mereça o Nobel.
Chega a altura dos Nobel. Há alguns anos que me questiono: quando irá a Academia sacudir o conservadorismo e atribuir o Nobel da Literatura a um autor fora do circuito ortodoxo dos livros? Será Tom Waits, por exemplo, que escreve como poucos sobre o amor e os falhados da vida, menos digno do que um escritor quase desconhecido que "funde, com realismo alucinatório, o folclore, a história e o contemporâneo"?